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sábado, 30 de janeiro de 2010

Deus e o destino da humanidade

NONADA. Ontem estive num posto de saúde da Prefeitura de Belo Horizonte, rotina daqueles que têm como trabalho os "biscates". Em tempos de trabalho on line, que está fora do "sistema" ou vira operador de telemarketing ou manobrista de carro em estacionamento. Na época da Revolução Industrial, há 200 anos, havia trabalho, exploração, desorganização das comunidades operárias, mas, em tempos da Era Digital, a exploração da mão de obra, ou mais valia, é a mesma, não creio que tenha mudado muito. O paradigma é outro, mas a ganância e o individualismo humano ... Bem, de volta ao Hospital Público, fui buscar uma consulta psiquiátrica. Minha doença já foi diagnosticada por Freud ao relatar, no início do século passado, o "Mal estar da civilização"; e é esta dificuldade de "se adaptar" que move pessoas aos psicoanalistas, psiquiatras e clínicos gerais, profissionais que tratam a "mente humana" com as lentes da ciência. Em termos de prioridade, considero minha angústia "sartriana" um "nada" frente ao drama dos psicóticos, dopados, esquizofrênicos, epilépticos etc, que procuram a cura e o alívio de seus males na saúde pública. Eu buscava o parecer de uma autoridade médica, numa ciência nova, que em pouco mais de um século procura desvencilhar os mistérios da mente e dos sofrimentos humanos, da complexa desordem física e imaginária do cérebro: a psiquiatria.
Constituída em laboratórios humanos (hospitais psiquiátricos, hospícios, manicômios ou sanatórios), como bem mostrou Focault, o desenvolvimento desta ciência apagou a mente de homens e mulheres com o uso arbitrário e político de eletrochoques, medicamentos psicotrópicos "pesados" que, em geral, instauram a apatia, a perda da vontade e das forças físicas e mentais dos indivíduos. As fogueiras da Santa Inquisição, na Idade Média, bem como nas épocas de ditaduras absolutistas, puniam os pecadores, os desajustados sociais, acusados de atos de  feitiçarias e subversão da ordem pública, quando as opiniões divergiam dos poderes instituídos; vozes eram silenciados e indivíduos trancafiados nestes "sanatórios", que tinham o propósito de sanar o problema, classificando as doenças psiquiátricas..
Alguns célebres médicos psiquiatras, que exerceram a crítica e a liberdade de pensamento como Reich e Jung, avançaram nas teorias de Freud e na construção epistemológica da nova ciência da mente humana. Mas o quadro que assistimos na atualidade é outro. Tem dupla face: a do paciente pobre, e a do paciente rico. No primeiro caso o serviço é precário, carente de recursos financeiros e vontade política, decorre da crise social e humanitária da Era Digital. O que vemos: pelos corredores escuros, entre bancos quebrados e paredes sem cor, médicos psiquiatras são descritos como juízes que podem condenar o doente ao internamento ou ao enterramento vivo na prisão de seu próprio Eu escravizado por drogas lícitas, apoiado em mitos religiosos, ou crenças totalitárias, que determinam o bem e o mal "em nome de Jesus".
Para pensarmos o espaço público, cada vez mais privatizado pelas corporações, sugiro a leitura do post no Blog do Emir, de 15 Nov. 2009: "Médicos do Povo para o Povo", publicado pela "Carta Maior". Os comentários mostram que em tempos de internet a participação pública abre brechas na exclusão social. O exemplo de Cuba é controverso, ante a crítica às ditaduras absolutistas, mas merece atenção no seu aspecto de preservação de valores humanitários.
PS> Em minha passagem por este centro de atendimento pesiquiátrico escutei de um dr.: "Não espere muito de mim". Óbvio que lhe devolvi as receitas que me prescrevera e voltei para a rua... a pensar, pois o maior dom de um ser humano é a liberdade de pensar, de sentir a beleza da vida e acreditar na força da solidariedade e do amor. No posto de saúde de meu bairro, Padre Eustáquio, encontrei abrigo no carinho que a funcionária pública disponibilizou ao me encaminhar a outro médico. Vamos lá. Prefiro acreditar na ciÊncia e deixar para Deus as outras questões.